quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Serra da Estrela

            Certo dia o meu companheiro de aventuras mandou para o ar: “já tens perninhas para ir à Serra...”, fuga??? Vamos lá!!
A Serra da Estrela é a cadeia montanhosa com maior altitude em Portugal Continental. Faz parte dos 700 quilómetros da cordilheira do Sistema Central, de Portugal ao Sistema Ibérico, juntamente com a Serra de Gredos anteriormente visitada, no centro da Península Ibérica.
O desafio era subir aos 1993 metros de altitude de bicicleta.
Chegados à Serra pensámos pernoitar no parque de campismo de Valhelhas, estava fechado... tivemos que optar por outro parque... Não querendo ficar longe do ponto de partida da volta, se bem que com algum receio devido ao nome comercialmente sugestivo, espreitámos o Skiparque, em Manteigas. Ficámos surpreendidos, ao contrário do que pensávamos, os preços eram idênticos, o espaço muito agradável e de ambiente serrano e mais perto do centro da vila. Na freguesia de Sameiro, em pleno Parque Natural da Serra da Estrela, o parque foi construído pela típicas pedras laminadas de xisto e granito da região. São rochas metamórficas formadas pela transformação física e química de outras rochas quando submetidas ao calor e à pressão do interior da Terra, dando-lhe um aspecto mineral em camadas.

 

Skiparque

Na manhã seguinte preparados para os 73 quilómetros a pedalar e 1600 metros de acumulado, depois do fuga mecânico pôr as biclas operacionais, começámos a dar ao pernil... Ainda não tínhamos saído da vila de Manteigas e já nos tínhamos perdido um do outro... isto vai correr bem!!! Volta ao ponto de partida, espera um pelo outro e começa então a fuga!! Espera.... "Upssss...... acho que perdi o track..." diz o guia!! "Perdeste o track e agora??", "agora acho que me lembro... vamos ver...". Agora é que isto vai correr ainda melhor, tenho que confiar na memória fotográfica e geográfica do guia, já cá esteve há uns anos atrás. E eu? Assim que sair de Manteigas não faço puto ideia onde estou... Aventura é aventura, siga pelo GPSmassacinzenta...
Ai queres fuga?! Então começas já com 13 quilómetros a subir de Manteigas, a 775 metros de altitude, até à Pousada de S. Lourenço nas Penhas Douradas, a 1300 metros... 500 metros de altitude a acumular em alcatrão que nunca mais acaba, depois de uma curva há sempre mais uma curva e outra curva.
Nesta altura, as bermas da estrada são delineadas pelos ouriços abertos com as castanhas a quererem saltar, não fossem os quilómetros que temos pela frente e levávamos já o jantar...


Ao olhar para trás começamos a ter a perspectiva de Manteigas a ficar cada vez mais pequenina, no meio desta vegetação e cores de Outono até o asfalto se torna bonito de se fazer...
Nas Penhas Douradas saímos para fora de estrada, “terra, queremos terra!!!”, tudo bem mas continuas a subir.... até aos 1400 metros... Passa um bttista por nós, passa outro e mais outro... "epá estes gajos dão-lhe bem!! Vamos experimentar esse caminho...", realmente o percurso estava sinalizado... quando demos conta estavámos no meio da prova do Campeonato Nacional de Rampa em BTT, de Manteigas às Penhas Douradas... Acabámos por subir com eles até lá acima, onde terminava a prova, ele ficaram, nós continuámos.
Descemos à Barragem do Rossim e fazemos uma paragem para descontrair o esqueleto, são muito quilómetros sempre a subir, a lombar começa a dar sinal e avisa para ter cuidado com a postura...



Lá continuamos, sobe, desce, sobe, desce, num estradão de pedras soltas, os pneus fugir, os músculos a ressentir do esforço para não parar, o truque é continuar a pedalar e distrairmo-nos com a vista sobre a aldeia do Sabugueiro, a aldeia mais alta de Portugal.
Descemos até à estrada de alcatrão, a Estrada Nacional 339 de acesso à Torre, a partir daqui só faltam 10 quilómetros a subir... a subir e a descer... subimos para voltar a descer, para subir mais um pouco e por aí adiante... está na altura de começar a gerir o esforço psicológico, esta parte, se bem que mais perto do objectivo, é estrada que nunca mais acaba, rectas com inclinação suficiente para moer a cada pedalada e parecer que nem no Natal lá chegamos...
Uhuu chegámos aos 1500 metros!


Estamos a chegar à Barragem da Lagoa Comprida, e bem comprida!! Esta barragem era um antigo lago glaciar que foi aproveitado para gerar energia.
Uhuu avistámos a Torre!! Esta visão foi como que uma cápsula de energia, um refresh de pedaladas, está quase!! O meu companheiro do pedal começa a ganhar vantagem, não tenho só o objectido de chegar à Torre como também de não ficar para trás...


Já na recta da pista de Ski da Vodafone, vou eu com a língua quase a tocar o alcatrão quando oiço: “Força!! Está quase!!”, grande maluco que vem a correr Serra abaixo... presumo que a teve que subir... a correr!!... Bora lá, afinal isto não custa nada, cada vez tenho mais vontade de chegar ao topo!
A Torre, como ponto mais alto de Portugal Continental, tem a característica do fácil acesso em alcatrão... se não nevar...
“Faltam 500 metros para chegares ao ponto mais alto de Portugal...” diz o meu companheiro do pedal fresco que nem uma alface, "Iupiiiiiiii!!!". Feitos 43 quilómetros chegámos finalmente aos 1993 metros de altitude. Paragem para a foto... os músculos parecem que vão rebentar e como a larica já aperta repomos energias com uma saborosa sandes de queijo da Serra e uma fatia de regueifa. Ficamos a contemplar o momento...


A altitude faz-se sentir com o friozinho da Serra e o arrefecimento dos músculos diz-nos que está na hora de continuar. Começamos a descida, agora até à Nave de Santo António. Todo o caminho é acompanhado por colossais blocos graníticos espalhados caprichosamente pela Serra dando-lhe magnificas paisagens.


A descida permite-nos gozar da velocidade e das curvas, o frescote entranhou-se de tal forma que tivemos que fazer uma breve paragem, o tremor era tanto que quase perdi o controlo do volante... Respirei fundo, absorvi os raios de sol e lá continuamos a verter adrenalina até ficarmos embevecidos com tanta bravura de cores... a Nave de Santo António...


Este extraordinário sítio é caracterizado por uma pequena planície entre dois planaltos, o da Torre, o qual descemos, e o das Penhas da Saúde, o qual vamos subir... A 1550 metros de altitude, a Nave dá início ao Vale Glaciar do Zêzere.
Estamos de tal forma maravilhados que já nem sentimos o cansaço das pernas e chegamos ao entroncamento das Penhas da Saúde. Daqui começamos a descer até Manteigas, pelo soberbo Vale Gaciar do Zêzere, o maior vale glaciar da Europa com 13 quilómetros de extensão e vestígios milenares de glaciação. Majestosamente em forma de U, possui os sublimes blocos graníticos característicos que desenham a paisagem e conduzem o eloquente Rio Zêzere, inteiramente português, genuinamente serrano com a sua nascente a 1900 metros, no Cântaro Magro.

Vale Glaciar do Zêzere
Na descida para Manteigas tinhamos duas opções, ou desciamos por alcatrão, o percurso do GPSmassacinzenta, ou  arriscávamos uma via romana encosta abaixo sinalizada como rota de caminhada... decidimos arriscar encosta abaixo do Vale Glaciar, uma da vias romanas que ligava Mérida a Viseu, mais tarde os portugueses serviam-se para fazer a ligação de Manteigas à Covilhã. Pelas suas pedras características, algumas movidas e desordenadas pelo tempo, esta descida é extremamente exigente tecnicamente obrigando-nos a desmontar e levar a menina às costas. Esta descida foi esplêndida pela paisagem e um autêntico bailarico de monta e desmonta.

Início da descida para Manteigas na encosta do Vale Glaciar

Avistamento da vila de Manteigas

Via Romana para Manteigas

Chegámos ao Viveiro das Trutas, chegámos a Manteigas... terminamos no centro da vila à procura de uma esplanada solarenga convidativa a repor os líquidos...
73 quilómetros de puro prazer, completamente agradados e satisfeitos com o ponto de fuga escolhido!! Este companheiro de fuga, guia, mecânico e tudo e tudo, é um espectáculo!! Obrigado por estes momentos...


Sem comentários:

Enviar um comentário