sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Rota da Mina das Sombras

Esta volta começou ainda em Portugal a poucos metros de Espanha... No caminho para a Portela do Homem somos presenteados com o passeio dos tímidos garranos, estes têm dono passeiam sozinhos.


Ainda em Portugal preparámos as biclas e... “Vamos ali a Espanha e já voltamos...” Passamos a fronteira a pedalar, começamos a descer a OU-312 na Província de Ourense.



Entramos à direita no verde da Baixa Limia Serra do Xurês. Estradão largo a subir, de curva e mais curva, a subir... aqui também existem rotas de caminhada mas não encontramos ninguém. O fuga vai à frente, faz-me sinal: “Chiuuuuu!!!....!, aproximei-me devagar... um veado a olhar para nós, tinha atravessado o caminho mesmo à frente dele...
E subimos.... subimos... a vista começa a ganhar dimensão, este é o bom de subir, é olhar para trás e dislumbrarmo-nos com a paisagem. A estrada é acessível, basta marcar uma sequência de pedalada e mantê-la até lá acima...


Chegados à cumeada da montanha com o rio lá em baixo do nosso lado esquerdo, continuamos a pedalar vale a dentro. Que caminho sensacional, desenhado pelos contornos das montanhas e dos gigantes de xisto aqui perdidos. Estamos cada vez mais dentro do vale, cada vez mais longe de tudo. Olhámos para a outra margem e vemos o trilho que iremos descer, mal sei o que me espera...
Quando pensamos que estamos relamente longe de tudo, aparece um senhor a passo rápido, galego pelo sotaque, vindo do nada e sem vestimenta apropriada para eventual caminhada que estivesse a fazer... ele há cada maluco... está bem que é a descer, mas teve que subir... parece ele que foi ali e já volta... de onde terá vindo?? Do trabalho?? Das minas?? Fiquei intrigada... Não era um simples caminhante, não era uma simples aventura como a nossa, eram passos decididos, rotineiros, roupa de trabalho, sozinho, de que será que ele toma conta?? Não há nada no fundo do vale... Ou será que há?? Ficou a dúvida pois foi a única vivalma que encontrámos até chegar à seguinte povoação e que muito ainda tivemos que pedalar para lá chegar.


Este vale acolhe uma das caminhadas emblemáticas desta zona, A Rota da Mina das Sombras. Bem refundido no vale está o que resta das minas de volfrâmio muito exploradas durante a II Guerra Mundial. Nesta altura era um metal escasso e muito valioso, era utilizado para endurecer o aço utilizado na blindagem aérea, foi portanto, uma verdadeira “mina” nesta altura de guerra. Entretanto, com o final da guerra e com os minerais vindos da China, da Birmânia e da Bolívia, os preços de volfrâmio desceram bastante, fazendo com que as Minas das Sombras entrassem em decadência. Estão desactivadas há mais de 50 anos, restam os trilhos e os vestígios do que em tempos foi abrigo e trabalho. Mas a nossa volta não chega às minas, para lá só mesmo a pé e de bicicleta às costas torna-se complicado.
Paramos no fundo do vale, no cotovelo do estradão, para “almoçar”, uma bela sandes sentados nas pedras do rio com uma sombra magnífica. Subimos 13 quilómetros e estamos a 1036 metros de altitude.



 Subimos mais um pouco e apanhamos o Sendeiro da Mina das Sombras, o tal trilho que tínhamos avistado do outro lado do rio. Este caminho era utilizado pelos mineiros para transportar diversos materiais, desce o vale sempre ao lado do Rio Vilameá. Grande descida que nos espera, o fuga avisa “cuidado que este é bastante técnico...” eu penso “bora lá...”. O bastante técnico tornou-se impraticável, as chuvas este ano vieram tarde e fortes, o trilho foi fortemente fatigado pelas pedras que rolaram pela serra e ali ficaram.



Até caminhar se tornou complicado, com os sapatos de encaixe... foi um verdadeiro monta e desmonta, torci o pé esquerdo três vezes e ainda agora estava no início... Ai a minha vida... se isto for sempre assim muito vou ter que penar... Mas é nestas alturas que paramos para respirar fundo e somos recompensados com as belezas da natureza, cascatas lindas deste rio lindo!!


Trilho bem estreito, pedras soltas, escarpas assustadoras, o sol a fritar os miolos, o rio lá em baixo, um deslize e é a morte do artista... Caio, apanho um susto daqueles e prefiro não arriscar... volto a desmontar!!!
Conforme vamos descendo vamos ficando mais perto da linha de água, o trilho vai ficando mais acessível, pedra partida a tombar para a água mas vai se fazendo.


Chegámos à linha de água, paramos na Ponte de Portas Paredes para refrescar um pouco e voltar a carregar baterias.


As lagoas que se formam com esta água apetitosa fazem deste cenário um real vale encantado.
Passamos a ponte para a outra margem e aqui o cenário muda literalmente de “verdura”... acabou-se o trilho estreito desorganizadamente empedrado e entramos como que numa floresta sombria e alcatifada.


A sombra acaba mas a alcatifa continua, subimos a montanha novamente e ficamos maravilhados, contemplamos os montes e montanhas que fazem deste Xurês um quadro harmonioso, digno de um aprazível panorama natural.


A alcatifa tornou-se nossa inimiga... O fuga diz “vem no meio do trilho, as pontas podem ter armadilhas”, a alcatifa estende-se por ali fora e esconde os buracos que estão por baixo... Assim foi, esbardalhei-me numa armadilha... pensava que que tinha tudo controlado, rodas em piso firme, quando ponho o pé direito no chão, uhuhhuuuu não havia chão... entrei com a perna na traidora alcatifa e fiquei a sentir que o seu aspecto fofo era mesmo só aspecto... aquele tapete castanho e verde que dá um ar delicadamente achamboado aos nossos olhos são na verdade silvas secas... autênticas, não digo ratoeiras mas, picadeiras!!! E não foi só a minha perna que sofreu com os picos agreste... foram também os pneus... “Tenho um fuuuuroo!!” tal não é o espanto que afinal não é 1... são 3!!! Na roda de trás!! Troca-se a câmara de ar e está pronto... Segue caminho.
Esta descida é realmente extraordinária, é um regalo para o BTT, curvas e curvinhas, pedras, dropes, tivesse eu levado câmaras de ar de gel e era perfeito. Acabado este singletrack de encher as medidas e estava eu para outra vez... agora eram 2 à frente... já não tinha nenhuma câmara de ar, restavam os remendos de reserva do fuga e a bomba para encher a cada 500 metros, continuo a perder ar, com certeza ficou outro furo por encontrar mas com tantos picos era melhor nem mexer mais...


Chegámos a Torneiros, a primeira e única povoação que passamos em todo o percurso. Conhecida pela sua piscina de água quente, graças à sua nascente de água quente natural transformando, tal como o nome indica, num Caldo o rio que ali passa, o Rio Caldo...
Decidimos não chapinhar, a água quente ia dar cabo dos músculos e ainda vamos precisar deles bem activos e sinceramente com o calor que está quenturas é coisa que não apetece...
Saímos de Torneiros por fora de estrada e agora, como quase sempre, resta-nos subir até à Portela do Homem. Esta parte do track foi verdadeiramente alucinante, havia fogo na serra e um helicóptero voava para trás e para a frente a lutar contra as chamas. O barulho das hélices a ecoar no vale, queríamos sair dali pois no meio do mato não conseguíamos perceber se o fogo estava perto ou longe, mas reparávamos que o helicóptero não saía dali... e o pneu ainda com um furo chato que me obrigava a dar à bomba constantemente...
Chegámos à estrada de alcatrão, numa curva bem apertada que tivemos que atravessar, aqui encontrámos a estrada romana e um recanto com marcos miliares, o trilho por onde deveríamos seguir novamente serra a dentro. Parámos para reflectir e tomámos a decisão acertada, fizemos os 3 quilómetros que faltavam até à fronteira por asfalto, mesmo com um ritmo considerável o final parece sempre interminável... Lá chegámos à fronteira... Lá chegámos a Portugal... Agora vou comprar câmaras de gel para a próxima volta...


Assim fizemos 30 quilómetros a pedalar o Xurês com 1330 metros de acumulado, mais uma fuga daquelas que nos enche a barriga até à próxima...

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